Assim como no Brasil, a gripe espanhola, causada por uma cepa mais agressiva do vírus influenza, chegou ao território goiano por um meio de transporte. Segundo historiadores, o País teve os primeiros infectados após a chegada de um navio de bandeira inglesa, no segundo semestre de 1918. Já no planalto central, a enfermidade veio pela estrada de ferro e atingiu, primeiramente, as cidades que a margeavam: Ouvidor, Catalão, Goiandira, Ipameri, Urutaí e Roncador. Logo, a notícia chegou a municípios mais distantes, que tentaram impedir o contágio da população, como a antiga Vila Boa, então capital do Estado.Um registro de telegrama publicado no Correio Oficial em 16 de novembro de 1918, descreve detalhes sobre aqueles que pareciam ser os primeiros casos identificados, que davam pistas da trajetória da gripe espanhola em Goiás. A transcrição, cujo formato foi adaptado para citação desta reportagem, traz notícias sobre Curralinho, atual Itaberaí; Rio Verde, então chamada de Santo Antônio do Rio Verde.“Curralinho: comunico haver oito casos de febre em pessoas que tiveram contato com o primeiro doente. Encerrei as escolas municipais. Santo Antônio do Rio Verde: grassa aqui a influenza espanhola. O comandante e todo o destacamento estão atacados, todos guardando o leito”, diz a mensagem. O trecho literal está presente em dissertação de autoria do doutor Leandro Carvalho Damacena Neto, durante Mestrado na Universidade Federal de Goiás (UFG), publicada em 2011.Em outro trecho, o autor do telegrama fala sobre Ipameri, cuja grafia se dava com y em vez da última vogal. O narrador se diz angustiado pela situação do município, que havia sido atacado “há dias” pela influenza espanhola. Há menção à existência de duas pessoas mortas e à criação de unidades de saúde. “Não obstante, os cuidados médicos e piedosos de alguns habitantes desta cidade tem prostrado a metade da população, havendo casos melindrosos, sendo dois fatais. Nesta situação, foram criados, por iniciativa popular, dois postos de socorros para receber os gripados”, conclui.Diante da situação, Vila Boa criou um cordão sanitário em Areias, último povoado antes da capital, a fim de impedir a chegada de pessoas doentes de Curralinho, a 45 quilômetros da cidade, pela ferrovia. À época, já havia registros da gripe espanhola em Anápolis, Morrinhos e Santa Rita do Paranaíba, atual Itumbiara. Em 19 de outubro de 1918, o jornal Correio Oficial falava da proximidade da doença da cidade de Goiás.“Felizmente para nós a capital do estado dispõe dos recursos precisos, medicamentos e médicos para combater a invasão da pandemia. O resto do estado, porém, não está prevenido como soe acontecer sempre, sendo de se aconselhar particularmente a todos a melhor provisão de drogas aplicáveis”, diz o texto, retirado da tese “As representações do medo e das catástrofes em Goiás”, do doutor em Sociologia Eliézer Cardoso de Oliveira. Surgimento indefinidoApesar de o nome sugerir o local de sua origem, a gripe espanhola não possui, ainda hoje, um ponto de surgimento definido. Ela leva o nome da Espanha por este ter sido o único país a divulgar para outros países a gravidade da doença, que tinha como sintomas iniciais febre, cefaleia, dores musculares, tosse, congestão nasal. Depois, evoluía para casos mais graves com complicações pulmonares. Ainda desconhecidos, os vírus não faziam parte das possibilidades cogitadas para diagnóstico. Em março de 1918, ainda durante a 1ª Guerra Mundial, houve aqueles que podem ter sido os primeiros registros de casos em soldados norte-americanos que seriam enviados à Europa para o combate. No mês seguinte, houve a manifestação da enfermidade em vários países. Aquele fora apenas o primeiro das três ondas da doença, tendo fim por volta de julho de 1918. A segunda, ocorrida a partir de agosto daquele ano, foi a de maior gravidade e durou até janeiro de 1919, atingindo o Brasil. Depois, um terceiro ciclo, menos letal, ocorreu entre fevereiro e maio daquele ano. De acordo com Leandro Carvalho Damacena Neto, praticamente todo o País estava infectado em outubro de 1918. À época, era comum a reprodução dos chamados “Conselhos ao Povo” nos jornais, que continham indicações das órgãos sanitários para o combate da gripe espanhola. No entanto, informações sobre número de mortos e a divulgação de notícias foi controlada pelas autoridades, segundo ele.