A chuva que caiu na noite de quinta-feira (11) e na madrugada e tarde de sexta-feira (10) trouxe velhos problemas de Goiânia à tona. Com o volume que corresponde a 77% do esperado para fevereiro inteiro, os 132 milímetros (mm) de água causaram alagamentos, invadiram casas, derrubaram árvores e provocaram a queda de energia em vários pontos do município.Segundo o Centro de Informações Meteorológicas e Hidrológicas de Goiás (Cimehgo), na noite e madrugada de quinta-feira a chuva foi de 132 mm. Este é o terceiro maior volume para um dia da história - a maior de todas ocorreu em dezembro de 2005, com 136,6 mm. Na ocasião, vários pontos da cidade ficaram alagados, como a Rua da Divisa, que liga os Setores Jaó e Santa Genoveva à BR-153. Na tarde desta sexta-feira, foram mais 38 mm. Desta vez, houve queda de árvores em sete pontos, conforme a Comurg. O Lago das Rosas, no Setor Oeste, transbordou. Na Vila Roriz, na Região Norte, a mais atingida, a enxurrada invadiu casas. Na BR-153, no limite entre Goiânia e Aparecida de Goiânia, motoristas pegaram a contramão para fugir da enxurrada - em vão. Na Rua 87, no Setor Sul, o Corpo de Bombeiros teve de resgatar uma mulher utilizando um bote.Cenário assim tem sido cada vez mais comum em Goiânia e é construído por uma junção de fatores, que vão da ocupação urbana desordenada, impermeabilização excessiva do solo e alterações climáticas. “Precisamos ‘descascar’ a cidade, resgatar as áreas verdes, respeitar as características de cada bacia”, alerta a vice-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Goiás, Janaína de Holanda.Para ela, são necessárias medidas macro, micro e urgentes. No primeiro grupo, está a implantação de um plano de drenagem para a capital que leve em consideração a topografia, índice pluviométrico e as bacias. “São necessárias obras de intervenção urbana”, cita. No segundo grupo, estão atitudes individuais, como não jogar lixo na rua e não pavimentar completamente as áreas residenciais. Por fim, alguns locais precisam de intervenções urgentes. “Sabemos onde estão os pontos críticos”, afirma.Muitos destes problemas foram se acumulando com o tempo. O analista ambiental e mestre em história Thiarlles Elias de Paula, que pesquisa a gestão ambiental desde a construção de Goiânia, na década de 1930, até os dias atuais, lembra que as cenas que estão se tornando cada vez mais comuns são reflexo de anos de desconstrução do projeto de Atíllio Corrêa Lima. O urbanista, conforme Thiarlles, projetou uma cidade que privilegiava as áreas verdes e já preocupava com a gestão do lixo, entre outros aspectos. “Onde hoje está a Marginal Botafogo, por exemplo, deveria existir um park way”, diz, se referindo ao modelo de vias públicas ajardinadas. Hoje, a avenida é um dos pontos mais críticos em relação aos alagamentos em Goiânia.Também havia a projeção de um cinturão verde, em toda a cidade, que incluía, entre outros pontos, o Lago das Rosas. Durante a chuva desta sexta-feira (12), esse foi um dos locais mais atingidos na capital, com o lago transbordando e atrapalhando o fluxo de veículos na Avenida Anhanguera. “Aos poucos, sobraram apenas algumas partes urbanizadas desse cinturão, como o próprio lago”, afirma Thiarlles em sua dissertação.Além da ocupação do que seriam áreas verdes, a pesquisa demonstra que o descuido com o lixo - citado pela vice-presidente do CAU, Janaína de Holanda - também tem raízes históricas. Reportagem do POPULAR do dia 25 de outubro de 1942, por exemplo, conta: “(...) Goiânia vem sendo invadida por um enxame de moscas (...). Esse fato tem como causa principal a quantidade de lixo que se está acumulando em lotes vagos”.Com uma cidade de 1,5 milhão de habitantes, este problema ganha proporções do mesmo tamanho. Segundo o titular da Secretaria de Infraestrutura de Goiânia, Luiz Bittencourt, o órgão retirou 863 toneladas de lixo de aproximadamente 6,5 mil bocas de lobo em Goiânia desde o início do período chuvoso, em outubro do ano passado.Em entrevista ao POPULAR, Bittencourt diz que a Prefeitura tem focado no aperfeiçoamento da drenagem, para diminuir os problemas causados pela chuva. “Todas as grandes obras, como o BRT e o complexo da Jamel Cecílio, estão sendo construídas com esta preocupação”, afirma. Mesmo com estas intervenções, é bom o goianiense se preparar. Segundo previsão do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), nos próximos dias haverá chuva e ventos intensos, caracterizando quadro de “perigo”.-Imagem (Image_1.2197412)-Imagem (Image_1.2197411)